quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

29. A Santidade da Igreja. Graça e Vontade.

29. A Santidade da Igreja. Graça e Vontade.



Traduzido pelo Presbítero Pedro Anacleto



Assim na teologia oriental como na ocidental, o interesse básico se centrou naturalmente no fato capital do cristianismo, a redenção. Só que no Ocidente o problema se posou desde um ponto de vista mais prático, diretamente religioso-moral (menos abstrato e especulativo).

As lutas tiveram lugar no século IV e a começo do V, e precisamente no norte da África, pátria clássica da teologia moral do cristianismo antigo. Aqui escreveu Tertuliano seus tratados fundamentais sobre temas morais, chocando com a estranha doutrina do montanismo; também aqui (ao lado de Roma) com a questão da readmissão dos pecadores na Igreja (especialmente os lapsi, § 12, II, 3) não só se ocuparam intensamente os ânimos ou se despertaram violentamente, senão que o mesmo Cipriano declarou inválido o batismo administrado pelos hereges (§ 17:6).

Desde que terminaram as últimas perseguições no norte da África (303-305), nas quais alguns cristãos demonstraram novamente sua debilidade, voltaram a posarem todas as velhas questões e teve novamente bispos que decidiram por um tratamento mais duro: os donatistas. Conseguiram rapidamente êxitos surpreendentes. No primeiro momento não chegou a uma ruptura completa, mas houve uma divisão efetiva da Igreja norte-africana em dois partidos antagônicos. Em seguida em algumas cidades, e logo na maior parte, se encontraram dois bispos se enfrentando. Isto deu origem a um verdadeiro cisma, que durou todo um século e pesou gravemente sobre a Igreja. Os acontecimentos cobraram uma importância fundamental pelo trabalho de clarificação teológica realizado então principalmente por Santo Agostinho: a essência do ministério eclesiástico, do qual apenas ninguém se havia ocupado até o momento, foi reconhecida e descrita com maior precisão.

1. O donatismo recebe seu nome do Bispo Donato de Casae Nigrae (+ 355); é um movimento rigorista e entusiástico, similar ao de Novaciano (§ 17:4): radicalizando uma postura dos primitivos cristãos ("passa a figura deste mundo," "vem, Senhor, Jesus"), encontram suspeito todo o mundano e estatal, e concretamente a Igreja imperial sustentada pelo Estado; por isso o bispo deve permanecer separado o mais possível do poder político. Vêem o ideal na Igreja que sofre e naqueles que permaneceram fiéis na perseguição; veneram enormemente, e até exageradamente, aos mártires e suas relíquias. Desconfiam daqueles que de uma ou outra forma fracassaram na perseguição; "com seu pecado, a Igreja de Cristo ficou, por, assim dizer, repentinamente destruída."

O bispo Donato e os bispos númidas, reunidos em um sínodo em Cartago (312), decretaram a destituição do Bispo Casiliano, recentemente eleito e anterior arquidiácono de Cartago, aduzindo como motivo que em sua consagração havia tomado parte um bispo indigno, um traidor ou traditor (= que na perseguição havia "entregue" os livros sagrados aos pagãos), tendo como pretexto que com isto era inválido a consagração. O sínodo chegou a designar um anti-bispo. O exemplo fez escola, e assim se chegou à mencionada difusão do cisma.

2. Nem todos os "donatistas" defendiam as mesmas idéias. Mas, prescindindo das flutuações, sua postura fundamental pode descrever-se assim: a santidade da Igreja e a validade dos sacramentos, em especial a da ordem, dependem da integridade (ausência de pecado) de quem os administram. A ordenação administrada pelos sacerdotes pecadores não é ordenação. Pouco a pouco, os bispos donatistas aplicaram também estes princípios ao batismo e implantaram a reiteração do batismo (também houve donatistas que rejeitaram dita reiteração). Se recluiram, pois, no estreito círculo dos considerados como piedosos, perfeitos e inteiramente puros, e com eles só pretenderam formar a Igreja Universal.

3. Tampouco esta luta se levou a cabo com puras armas espirituais. Foi também uma luta de poder com muitos elementos humanos, demasiado humanos, por meio de intrigas e invejas, rivalidade dos númidas contra Cartago, dos africanos contra Roma. Também o Estado (com esse estilo incongruente que caracteriza a política religiosa de Constantino e de Constâncio) aplicou meios violentos (exílio) contra os donatistas; estes, em troca, aceitaram (bastante ilogicamente) o apoio que os deu o imperador Juliano; até chegaram a empregar contra os católicos suas próprias tropas de choque, social e religiosamente radicais, formadas por campesinos descontentes (circumceliones). Houve ásperas discussões; os escritores eclesiásticos da época nos dão conta de ameaças de toda classe, inclusive de homicídios e mutilações.

Mas nem a intervenção do poder imperial, nem os esforços dos bispos de Roma, nem a resposta teológica do Bispo Optato de Mileve desde o ano 365 (+ 399), nem toda uma série de sínodos puderam superar o cisma. Unicamente as divisões internas do grupo e a reação teológica e pastoral dos católicos, mais sistemática em tempos de Agostinho (desde o ano 393; muitos sínodos de bispos católicos), foram preparando a derrota. Depois uma entrevista sobre religião celebrada em Cartago no ano 411 (286 bispos católicos, 279 donatistas), interveio energicamente o poder estatal. Por fim se pôs a irrupção dos vândalos (429).

Um donatista de tendência moderada, Ticônio, foi o primeiro que qualificou a grande Igreja como obra do diabo = Babilônia.

4. Nesta luta com os donatistas sucedeu que Santo Agostinho mudou de idéia sobre o modo de combater a heresia. Ele conhecia bem as dificuldades para chegar à possessão da verdade (cf. § 30) e durante longo tempo quis empregar unicamente a confrontação intelectual. Quando chegou a ser bispo de Hipona, também ele teve que enfrentar um pastor competidor; não pensou em utilizar sua força. Mas então viu claramente que o que estava em jogo era um valor inalienável. Os donatistas ameaçavam o bem supremo, a unidade da Igreja; traziam o pior dos males, a separação real da Igreja. E esta separação devia ser evitada. Santo Agostinho começou enviando uma carta conciliadora, para chegar a um colóquio fraterno com seu colega episcopal. Mas como a parte contrária se evadiu para um relativismo errôneo, afirmando que, definitivamente, era indiferente em que partido se era cristão, quando além, ameaçou com a violência e pôs em prática suas palavras, então compreendeu que tinha razão o amargo compelle intrare (Lc 14:23). Porém, os bispos ortodoxos, todavia durante a mencionada entrevista do ano 411, se ofereceram em uma carta de Agostinho a renunciar eventualmente a suas sedes episcopais para assegurar a paz: "a dignidade episcopal não devia ser obstáculo à unidade dos membros de Cristo." Aqui se adverte um grandioso impulso de espírito pastoral, pronto a amar e servir, modelo de colóquio entre irmãos cristãos separados.

5. Outro movimento de piedade excessiva (= entusiasta), que igualmente exigia uma ascética rigorosa e a fomentava sobre tudo nas assembléias privadas, se originou na Espanha com Prisciliano, um secular culto e rico (mais tarde bispo de Ávila).

Estes movimentos ascéticos que se tornam heréticos não devem ser considerados isoladamente, pois do contrário podem resultar antinaturais para nossa mentalidade. São, apesar de tudo, o reflexo herético de grandiosas tentativas ascéticas dentro da Igreja ortodoxa, que além de tudo, ao menos em parte, nos parecem bastante estranhos: os estilitas (anacoretas), o jejum contínuo dos ermitãos, especialmente no deserto egípcio. Só a vida cenobítica ordenada por uma regra (§ 32) reduziu estes impulsos violentos, fazendo acessível a muitos, não só a uns poucos, a imitação de Cristo na cruz e na penitência.

Uma sobrevalorização muito diferente da ascética, mas que ao princípio foi completamente natural na Igreja, a encontraremos no pelagianismo.

Os apologetas haviam se servido da filosofia estóica, entre outras, para explicar a doutrina da ação moral do homem, como antes para solucionar o problema do conhecimento de Deus. Mas a formulação científica não havia impedido fundamentar a vida cristã na graça. Haviam evitado o perigo de fundar a vida cristã sobre uma base natural em vez de sobrenatural.

6. O monge Pelágio (+ 418), oriundo de Britania, teve umas idéias que pareciam favorecer uma sobrevalorização das forças morais naturais no processo salvífico. Mas foram seus discípulos, especialmente Juliano, bispo de Eclano, próximo a Benevento, quem as desenvolveram até construir o pelagianismo propriamente dito. Basta considerar as formulações abstratas deste sistema em si mesmas e em suas conseqüências práticas, logicamente dedutíveis, para ver que já não se trata de religião cristã, senão de naturalismo; sustenta, em efeito, que a natureza do homem, tal qual é, é capaz por seu próprio conhecimento e especialmente por sua livre vontade evitar o pecado e fazer méritos para o céu.

Com semelhante doutrina se punha em tela de juízo tanto a necessidade da graça como a necessidade da redenção e, em conseqüência, a revelação cristã em geral 25.

Suposto básico desta doutrina era o conceito de que o pecado de nossos primeiros pais, inclusive seus efeitos, foi assunto meramente pessoal, não ficando por isto debilitada em absoluto a natureza humana.

Pelágio, pessoalmente, foi um homem fervoroso; Santo Agostinho o chama vir sanctus. Vindo de Roma, fugindo dos devastadores visigodos, chegou com seu discípulo Celestino a Cartago no ano 410. Em 416, a doutrina que levava seu nome foi condenada por dois sínodos africanos (Inocêncio deu sua aprovação de Roma no ano 417; Santo Agostinho: Roma locuta, causa finita) e logo outra vez no sínodo geral do ano 418 em Cartago e do ano 431 em Éfeso. Mas a luta no Oriente se prolongou até o ano 450 aproximadamente. Ali Nestório apoiou a Pelágio (que se havia transladado para a Palestina) e sua doutrina foi inclusive reconhecida por sínodos locais. Também Juliano se transladou ao Oriente, quando o imperador Honório desterrou aos pelagianos da Itália.

O pelagianismo foi substituido pelo chamado semipelagianismo, que sustentava que a graça é necessária, mas não para o começo da conversão, e que tampouco é necessário uma graça particular para a perseverança final. (Paladinos desta doutrina foram antes de tudo os monges de Marselha; daí a denominação de "controvérsia marselhesa").

A luta durou até finais do século VI (a condenação teve lugar no ano 529, em Orange). O grande oponente do pelagianismo foi o doctor gratiae, Santo Agostinho.

25 Quando em Pelágio a graça aparece como auxílio útil (não necessário) para o homem, se entende como algo surpreendentemente exterior, não interiormente transformante, mas bem no sentido que logo se denominará nominalista.



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Sacerdote ortodoxo e busco interessados na Santa Fé, sem comprometimentos com as heresias colocadas por aqueles que não a compreendem perfeitamente ou o fazem com má intenção. Sou um sacerdote membro da Genuina Igreja Ortodoxa da Grecia, buscamos guardar a Santa Tradição e os Santos Canones inclusive dos Santos Concílios que anatematizam a mudança de calendário e aqueles que os seguem, como o Concílio de Nicéia que define o Menaion e o Pascalion e os Concílios Pan Ortodoxos de 1583, 1587, 1593 e 1848. Conheça a Santa Igreja neste humilde blog, mas rico no conteúdo do Magistério da Santa Igreja. "bem-aventurado sois quando vos insultarem e perseguirem e mentindo disserem todo gênero de calúnias contra vós por minha causa. Exultai e alegrai-vos pois será grande a vossa recompensa no Reino dos Céus." "Pregue a Verdade quer agrade quer desagrade. Se busca agradar a Deus és servo de Deus, mas se buscas agradar aos homens és servo dos homens." S. Paulo. padrepedroelucia@gmail.com