terça-feira, 10 de janeiro de 2012

37. Vida e Atividade Social da Igreja na Época Merovíngia.



Traduzido pelo Presbítero Pedro Anacleto

1.  O evangelho conta com uma certa ordem espiritual, social e moral. Em períodos de baixo nível ou de ocaso cultural, quando chegam a faltar estas órdens, o fruto da palavra de Deus (na medida em que a podemos conhecer por seus frutos) há de ser em geral menos copioso. A formação da alma cristã dos povos ocidentais foi uma tarefa de gigantes, e sua realização a Igreja só podía lográ-la pouco a pouco e com múltiplos retrocessos, e ainda assim não do todo. Ao considerar estes primeiros séculos, devemos sempre pensar nas extraordinárias dificuldades que obstaculizavam uma autêntica cristianização. Além de tudo, ainda apesar dos contatos preliminares com a Igreja galo-romana, as dificuldades foram pouco menos que inevitável naquela instável fase de transição política e social, agravada com as conversões colectivas de homens que ansiosamente preguntavam pelas vantagens e benefícios da nova religião 13. Por Bonifácio e por muitas outras fontes sabemos que a cristianização foi a pouco muito superficial e durante séculos arrastou consigo muitos elementos pagãos. Isto é uma constatação objetiva dos fatos, mas constatação que naquele longínquo século VI não implica a mesma censura que quando comprovamos mais tarde, depois de longos séculos de vida cristã, um fracaso semelhante em forma de decadência moral e religiosa (cf. Renascimento).

2. Algumas etapas importantes desta evolução: desde o ano 556 no Império franco se proibiu o culto pagão público; se prescreveu por lei o descanso dominical e festivo. A vida cristã-eclesiástica começou, inclusive entre os germanicos, a criar uma expressão própria, a imprimir seu carácter à vida diária, ao curso do ano, aos usos e costumes.  No âmbito estritamente religioso se introduziu a confissão ao princípio da quaresma e a prática da comunhão três vezes ou, quando menos, uma vez ao ano. Também se extendeu a prática da comunhão dominical (sob as duas espécies; o comungante recebia a santa comunhão na mão direita). A participação dos fiéis na mesa (dominical) parece ter sido muito diversa segundo as circunstâncias, o maior ou menor zelo dos bispos, a efetividade dos sínodos e suas correspondentes prescrições legais. Em suma, se pode constatar uma "boa" participação, sem que isto deva tomar-se como uma adequada descrição do fervor religioso dos diversos estratos da população. Em geral se pode afirmar com certeza que a cristã se impôs no Imperio dos francos com suficiente correção ou que se trouxe um lamentável desmoronamento se levantou de novo, ainda que lentamente e com muitos resíduos subcristãos (§ 38); mas tanto a piedade como a moralidade deixaram muito que desejar.

3. A piedade daquele tempo cobrou um colorido especial por uma muito acentuada veneração dos santos na forma de veneração de suas relíquias.
O santo, cujas relíquias descansam na Igreja, era o protetor da comunidade, o "santo patrono." Por isto era também o autêntico dono dos bens da paróquia, por cujo bem-estar e mal estar se preocupa. Se compreende assim que com frequência não se vacilasse em entrar em possessão de um auxílio tão poderoso, inclusive por meio do roubo. O estado das coisas neste sentido chegou a ser nos séculos VII e VIII verdadeiramente ruinoso e deplorável. "No século VIII o roubo de relíquias foi algo usual em toda a cristandade" (Schnürer).

Tanto na veneração dos santos como de suas relíquias teve um papel muito importante o temor; por isso na primeira Idade Média não se dividiram as relíquias; bastava com as relíquias de contato (do sepulcro ou do relicário). A veneração das relíquias constituiu uma característica particular de toda a Idade Média 14. E sempre se viu caracterizada por uma excessiva exterioridade e, às vezes, a uma aceitação de que era quase mágica. Isto não tem deixado de ser um motivo muito sério de meditação para a Igreja. Não transpassou esta acomodação aos limítes permitidos pelo evangelho? Não se fomentou com isto uma religiosidade legalista e moralista que, ao colapsar-se objetivamente, teve efeitos nocivos na dissolução da piedade da tardia Idade Média?

Por outra parte, a veneração das relíquias, durante muitos séculos até a Reforma, atraiu aos grandes santuários multidões de fiéis de toda Europa: a Roma, donde descansa São Pedro, porteiro do Céu; a Conques de Santa Fé (que se fez famosa depois de ser levada alí depois do roubo de Avranches); a Santiago de Compostela, a Canterbury, aos santos "nacionais" dos francos (já com Clóvis I) e a São Martinho de Tours (316/17-397) com seu manto 15.

4. Na moralidade houve mais sombras que luzes. Especialmente no século VII a linha foi em queda. No princípio do século VIII, "tudo o que havia sido iniciado (pela Igreja) esteve em perigo de perecer de novo" (Hauck).

a) O mal começou na pico. Muitos membros da casa real franca se mancharam com atos de incrível e assassina crueldade. As notícias do historiador desta época, São Gregório de Tours, nos demonstra o terrivelmente natural que resultava tudo isto no século VI.

A causa imediata destas crueldades desumanas dos soberanos francos e de suas mulheres foi a "desditada mentalidade germânica," segundo a qual o império ou uma parte do império, depois da morte de seu senhor, tinha que ser dividido em partes iguais, como uma propiedade privada, entre todos seus filhos. A rivalidade, de forma indiscriminada, se servia de toda sorte de intrigas e de assassinato às claras: de 89 membros da dinastia merovíngia, desde os filhos de Clóvis em diante, 21 morreram de morte violenta.
Também a moral do matrimônio teve um nível perigosamente baixo. Uma de suas causas foi, sem dúvida, a politização do matrimônio pela já mencionada sucessão hereditária germânica. A isto também contribuiu desfavoravelmente uma série de medidas legais eclesiásticas. Estando proibido o matrimônio até ao sétimo grau de parentesco na linha colateral, havia grandes possibilidades de anular o matrimônio. Tampouco foi rara neste tempo a união sacrílega com monjas.

Para explicar a frequente degeneração sexual dos francos neste tempo temos que retornarmos às circunstancias típicas daquele estado de transição (brutalidade dos primitivos, perversão dos galo-romanos; a nova consciência moral só apareceu com o cristianismo).

b) Houve muita deslealdade, inclusive crueldade, que em ocasiões não se deteve nem diante do direito de asilo ou tratou astutamente de iludí-lo 16. Esteve muito extendida a embriaguez e a desonestidade. A vida do próximo valia muito pouco, a santidade do juramento usava-se esquecer logo ou se reinterpretava grosseiramente 17.

c) Não faltaram bispos e sacerdotes entre os degenerados nem entre os assassinos. No século VII a maior parte dos bispos do Império dos francos estavam casados, suas dioceses eram como um patrimônio familiar. São Bonifácio nos informa da enorme secularização do clero e do episcopado por volta dos anos 700 a 750. Também na Itália os sínodos se lamentaram das graves faltas de moralidade no clero, por exemplo, o de Roma (743).

Para explicar este estado de coisas (ou esta massiva degeneração moral) temos que ter presente que o terreno espiritual do mundo germânico estava ainda por cultivar, todavia não estava suficientemente preparado para admitir a semente da boa nova. Nos primeiros tempos, a cristandade germânica ainda não tinha força interna para realizar plenamente o mandato de Cristo.

5. Frequentemente encontraremos na história da Igreja anomalias religiosas, morais e eclesiásticas. O cristão ortodoxo não deve ter objeções ao constatá-las como são. A verdade é também aqui a única apologia duradoura. Mas a verdade exige por sua vez que se tome em consideração todo o curso das coisas, não somente as sombras. Tem que ter presente que o mal faz mais ruído que o bem. O mal é mais agressivo e por suas cores brilham e permanecem na memória dos povos.O bem é mais discreto, às vezes até nem temos notícia dele. O mais importante é que as anomalias sempre tem sido vencidas e superadas pela Igreja; e disto se deduz claramente que a santidade da Igreja é substancial e não depende da debilidade de seus membros. Mas assim como temos que indicar e delimitar segundo as fontes o modo e maneira destas anomalias, o mesmo tem que fazer com sua superação. A Igreja é e seguirá sendo Igreja de pecadores, e no curso da história o tem sido às vezes de forma trágica.

As deficiências da primeira Idade Média, isto é, do tempo de sua fundamentação, demonstram inequívocamente o baixo nível espiritual interior em que se encontravam muitos dos homens com quem e em quem tinham que trabalhar os mensageiros da Fé e os bispos de então. Com o qual tambem eles são um expoente da força da Igreja, se considerarmos o muito que então se conseguiu no aspecto moral e social.

Para tratar de uma maneira frutífera desde o ponto de vista religioso as anomalias da primeira Idade Média, o melhor método nos ofrece a História Francorum de São Gregório de Tours, donde se tem tomado a maior parte dos exemplos citados. Em seu capítulo final conjura a seus sucessores na sede episcopal de San Martín, pela segunda vinda de Cristo o dia do juízo, a deixar intacta esta documentação, com suas páginas luminosas e obscuras. E com razão. Pois quando o anatematiza os tristes crimes dos francos como pecados que clamam ao céu, presta o melhor serviço à verdade e à imutável lei divina.

Ao julgar o baixo nível moral do tempo é importantíssimo não perder de vista o seguinte: o que nós temos definido como degeneração e mediocridade, para os cristãos de então foi um pecado que em numerosos casos particulares se impôs claramente pela força, mas que jamais foi capaz de perverter a verdade nem a lei. Com frequência, ao crime brutal correspondeu uma penitência não menos violenta. É altamente significativo que estes poderosos e violentos guerreiros, em meio da confusão de finais do século VII, souberam morrer com heroísmo verdadeiramente cristão, como, por exemplo, o bispo São Leodegario de Autun. Sendo chefe da nobreza franca, tão ansiosa de independência, entrou em conflito com o mordomo neustrio Ebroino, que mandou por o cerco em sua própria cidade episcopal. Para salvar de pilhagem a população, o mesmo se entregou a seus inimigos. Mutilado e cego, mas sem sinais de ódio, morreu sob o machado do verdugo como "guerreiro de Deus" que depois depôs as "velhas armas." Uma carta de despedida a sua mãe Sigrada, escrita da prisão, demonstra de forma impresionante quão profundamente havia arraigado a graça de Deus nos francos, apesar de tudo.

6. Todas estas realizações, em sua maior parte, foram o resultado da ação sistemática da Igreja. A base de todo seu trabalho foi sua firme doutrina, fixada dogmaticamente e defendida sem vacilações. Sobre esta mesma base se levantou o culto, celebrado de forma regular, com a cura das almas a ele enerente. No culto se oferecia e pregava ao povo a salvação dia após dia (como nos mosteiros) ou quando menos aos domingos e dias festivos ao longo de todo o ano eclesiástico. Esta contínua assistência deu rápidos frutos em algumas partes e, ao longa, cristianizou e eclesializou a todo o povo.

A força específica que permitiu à Igreja tirar proveito de sua potencialidade religiosa e levá-la a muitos ininterrumpitamente foi sua organização em dioceses e ligas metropolitanas, herdadas do tempo dos romanos. Ela foi também a que a fez muito superior ao arianismo germânico (§ 26). Os bispos do Império franco — a fins do século VI havia 125 sob 11 metropolitas — trabalhavam bastante unidos. Outro meio, provado já desde a antiguidade, foram os sínodos, em boa parte os sínodos provinciais, mas sobre tudo os concílios imperiais convocados pelo rei (mais de 30 no século compreendido entre 511 e 614). No século VI os sínodos demonstraram uma enorme efetividade interna. Se afrontaram questões religiosas, morais e culturais em general (naturalmente, também seculares). A preocupação dos bispos se centrou tanto no clero como no povo. O episcopado (a uma com determinados missionários) constituiu neste tempo o fator moral mais sobresaliente. Os mesmos bispos (e sacerdotes casados não devem ser totalmente excluídos deste louvor, já que a regulamentação romana do celibato ainda não se havia imposto nem muito menos em todas as partes. Em particular entre os germanos, o celibato todavia não era obrigatório. E, por fim, inclusive entre os bispos que se enriqueceram com os bens da Igreja ou os herdaram, não faltaram quem manteve igrejas e mosteiros, fundando inclusive outros novos. Em última instância, se tratava em todo caso de seus bens (§ 34, IV: direito da igreja privada).

7. A atenção pastoral do campo se prestava desde a cidade (civitas) e era competência do bispo, seus presbíteros e diáconos (§ 24). E assim se manteve em parte até o século VIII.

Mas os germanos eram um povo campesino. Quando com sua irrupção no Império romano as cidades e a cultura cidadã decaíram (sua dissolução se deve também a outras causas), a vida voltou outra vez ao campo. Este sucesso rejuvenesceu a Europa. A moral cristã, orientada de sua comunidade natural-sobrenatural, pode assim conformar as comunidades familiares e rurais e, partindo destas raízes, efetuar logo a construção de toda a vida européia. Desde 500 aproximadamente començaram a surgir no campo paróquias independentes, as paróquias rurais. Estas paróquias, em comparação com a população residente nelas, eram muito extensas e nem sempre exactamente delimitadas. As divisões se fizeram mais tarde. Seu desenvolvimento foi muito distinto no Oriente, em Roma e entre os germanos.

Nos países germânicos, a grande paróquia rural constituiu o centro eclesial, seguindo o modelo das antigas formações políticas das centúrias, aos distritos e as marcas ou também das instituições culturais pagãs. Assim, primeiramente apareceram as igrejas paroquiais corporativas ou unificadoras. Com a organização do senhorio territorial e a crescente feudalização, a igreja privada passou a ser mais e mais a base da organização eclesiástica do campo. Por muito nociva que fora a figura jurídica do sistema da igreja privada para a vida da Igreja em seu conjunto, a criação e o desenvolvimento da paróquia rural foi essencialmente fruto de tal sistema.

Se criava uma paróquia. Os bispos levantavam um templo à custa de seus próprios bens ou dos bens da Igresia. Ou bem os ricos proprietários de terras erigiam junto a suas residências (ao princípio para seu uso privado) uma capela (igreja privada, própria). Ou bem uma corporação ou grêmio (marca) fundava uma igreja para si. A igreja se dotava com bens raízes. Nela havia um sacerdote permanente, ou bem a cura das almas era atendida por clérigos itinerantes, nos primeríssimos tempos também por corepíscopos ou bispos delegados, (§ 24). Da mesma igreja, paróquias se fundavam logo outras igrejas que costumavam depender por longo tempo da igreja mãe mediante os direitos paroquiais e os dízimos. Mais tarde, o sacerdote de uma igreja rural recebeu o título de parochus, pároco; ele mesmo devia eleger e instruir adequadamente a seus sucessores. Na época merovíngia, pelo mais, a atividade pastoral do baixo clero, ao princípio recrutado preferentemente entre os indivíduos não livres do próprio feudo, não pode estimar-se muito elevada. O senhor feudal, se para ferreiro elegia ao mais forçudo, para o oficio eclesiástico elegia ao mais débil ou ao mais engenhoso (cf. U. Stutz).

O surgimento de paróquias rurais foi, portanto, a mais importante façanha espiritual e social da Igreja na primeira Idade Média: mediante a pessoa do "pároco" se logrou por em contínuo contacto com os ignorantes do campo um homem "instruído" espiritualmente, isto é, preparado para a pregação da revelação cristã. Junto com os mosteiros, ainda que em um plano inferior, temos aqui um vivo foco de luz e calor para a nascente cultura ocidental.

8. A saúde espiritual de uma grande comunidade ou de um conjunto de tais comunidades não pode medir-se exclusivamente por resultados extraordinários particulares. Também estes devem integrar-se em uma análise exaustiva. De fato, o valor e a força da múltipla atividade da Igreja no Império franco se evidenciou em uma série de santos bispos deste período, que pelo mais, e significativamente, foram em sua maioria galo-romanos: Cesáreo de Árles (503-542), Avito de Viena (+ 518), Remígio de Reims (+ 533). Célebre foi o bispo Nicécio de Tréveris (+ 566), nascido em Reims, homem verdadeiramente apostólico e intrépido (isto significava então muito mais que hoje), que, igual que a Santo Ambrósio, teve clara consciência de que o poder moral da Igreja é muito superior ao poder político externo e que disse a verdade inclusive aos reis (excomungou a Teodeperto e a Clotário). Junto a ele temos a seu contemporâneo São Germano, bispo de París (555-576), que excomungou ao rei Cariberto por seu matrimonio com uma monja. Outros nomes; Ricário (no ano 625 fundou a abadia beneditina de Céntula na Picardia), Audoin (Normandia, + 684), Didier (bispo de Viena, + 607) e Eloy (Eligius, bispo de Noyon, 640-659).

O santo bispo Gregório de Tours (+ 594) foi um dos homens mais influentes da época merovíngia. Sua Historia dos francos é certamente demasiado crédula para aqueles primeiros tempos, em particular por seus relatos maravilhosos, mas pelo mais constitui nossa fonte mais fidedigna para o século VI. Em São Venâncio Fortunato (nascido en Treviso, educado em Ravena, morto antes do ano 610 como bispo de Poitiers) teve a Igreja merovingia seu último poeta relevante. Seus hinos eclesiásticos (por exemplo, o Vexilla regis prodeunt) ajudaram às celebrações litúrgicas de numerosas igrejas novas 18 ou se utilizaram (como o hino Pange lingua) para a veneração de uma relíquia da Cruz. A perfeição formal destas poesias nos dá uma impressão direta da forte influência que ainda exercia a cultura antiga, como o Norte se afundou na barbárie.

9. Tampouco faltou nestes tempos a ascesis heróica. Entre os monges, monjas e ermitãos revestiu às vezes um caráter violento. Nem, porém para os rudes homens da época supôs uma espécie de pregação sumamente efectiva 19.

a) Mencionemos só alguns nomes: Leonardo (século VI), Goário ( 500), Humberto (+ 727), Lamberto (+ 705), Emerano (+ 730), Corbinian (+ 725), Prayecto (+ 676), Ruperto (ao parecer da estirpe dos príncipes francos, + 732).

Numerosas fundações de mosteiros foram mostra da força de atração do ideal monástico. O convento de Poitiers, fundado por Radegunda, contava no momento de sua morte com mais de 200 monjas.
Junto à crueldade e rude indignidade de alguns soberanos, que encontraram companheiras da mesma condição, igualmente abomináveis (Chilperico, + 584, e Fredegunda), houve luminosas figuras de santos, como Santa Radegunda (de Turingia, 518-587), esposa do imoral e violento Clotario I, cuja importância espiritual se deduz do simples fato de que um homem como Venâncio Fortunato recebera inspiração do mero trato com ela. Aqui devem figurar também a rainha Batilda (escrava anglosaxona, + 680), Bililda (século VIII), Gertrude de Nivelles (parente de Pepino de Heristal, + 653), Adelgunda (+ 695), Odília (filha de um duque Alamán, + 720) e Erentrudis (sobrinha de Ruperto, + 718).

b) Alguns sínodos organizaron a assistência aos pobres, ao qual se converteu em um dever moral e serviu para combater a miséria e eliminar a mendicância. Desde o ano 350 aproximadamente havia também leprosários e inclusive, aos que favoreceram agora piedosas instituições.

Melhorou a sorte dos escravos. O mais importante ao longo foi o reconhecimento da liberdade interior, o que conduziu a uma equiparação no terreno religioso e facilitou seu reconhecimento no plano social: o escravo se converteu paulatinamente em servo da gleba. Mas contra a escravidão não se procedeu de forma revolucionária. Alí donde os bispos e mosteiros requeriam a ajuda de servos para trabalhar suas terras, estes foram tratados de forma geral, humanamente. Os bispos nunca deixaram de esforçarem-se por sua liberação. 

Também, neste ponto houve de tudo: não só um sensível progresso, senão também significativas vacilações. 
Na realidade, a liberação só foi efetiva em forma de uma nova relação de servidão em relação à Igreja.

Com a conversão da população do império à fé cristã e a medida que o clero foi impondo-se como guia espiritual, as questões que nos ocupam passaram cada vez mais (direta ou indiretamente) ao âmbito de responsabilidade dos clérigos. Uma solução plenamente válida devia satisfazer por igual às exigências espirituais e às seculares. Não deve surpreendermos que isto não se conseguisse ao todo. Donde se logrou muito foi no aspecto espiritual-caritativo, ainda que não com total desinteresse (pensão vitalícia para os anciãos e aos que se encontravam em apuros econômicos, aos quais negociavam suas propriedades imóveis à Igreja; créditos dos mosteiros a troca do penhor dos bens e às vezes também da liberdade). Muito meritória foi a luta da Igreja contra a usura: nem porém, a proibição radical da cobrança de interesses e a consequente proscrição das transações monetárias em geral ocasionou depois graves prejuízos.

c) Tampouco se deu uma resposta unitária à questão de se os não livres podiam assumir cargos eclesiásticos. Os Papas Leão I e Gelásios condicionaram a admissão dos não livres a sua liberdade. De fato, muitos escravos e colonos fugidos de seus senhores encontraram frequentemente acolhida e proteção no clero ou em um mosteiro 20. Se o senhor os pedia, os clérigos menores eram restituídos; mas os diáconos e sacerdotes podiam compensar ou resarcir a seu senhor. Os sacerdotes conservavam sua dignidade, mas perdiam seus ingressos. No Império franco, o bispo que conscientemente ordenara o diácono ou sacerdote a um escravo tinha que resarcir a seu senhor com o dobro. De fato, na maioria das vezes era entregue ao senhor na qualidade de sacerdote. Com a difusão do sistema da igreja privada no século VII se multiplicaram os casos em que os servos eram ordenados para o serviço das igrejas privadas. Só com a legislação carolíngia ficou suprimida esta anomalia.

A Igreja protegeu também nesta época as mulheres, especialmente às viúvas. A fábula de que o chamado concílio "inimigo das mulheres," o Concílio de Mâcon (um sínodo geral franco convocado no ano 585 pelo rei Guntram sob a presidência do santo bispo Prisco de Lion), nega-se a alma das mulheres, se baseia na falsa interpretação do argumento apresentado por um dos participantes do concílio, a saber: que não se pode chamar a mulher hominem, pois homo quer dizer varão, não-homem (= ser humano) 21.

10. A pesar de tudo, nesta época, como temos dito várias vezes, não logrou um progresso duradouro.
Já conhecemos várias das diferentes causas. Mas se desejamos uma ampla explicação desta diferênça, deveremos ouvir a resposta contida na obra daquele homem que, descontente com o acima dito fracassou, buscou os meios para remediar a situação: segundo São Bonifácio, a causa principal tem sua base no fracasso dos bispos francos, e principalmente em um defeito objetivo de sua orientação fundamental. Entre eles não houve um pensamento eclesiástico-universal e canônico, senão mais um desejo de poder essencialmente egoísta. Faltou a vinculação considerada por Bonifácio como necessária para as igrejas, a colaboração com a liderança apostólica, com o centro da Igreja, com o papa. Como os papas de então, São Bonifácio viu que as igrejas territoriais eram um pressuposto indispensável para a construção da Igreja. Mas o isolamento de Roma implicava o perigo de uma separação ou de uma atrofia particularista em muitos sentidos.


13 Segundo a concepção básica da religiosidade germânica, no sentido do do ut des.

14 A importância do culto das relíquias na obra interna da piedade cristã pode ilustrar-se comparando-a com a piedade da Igreja oriental: o que para o Ocidente é a relíquia, para o Oriente é o ícono, ao qual certamente pressupõe uma compreensão racional da verdade venerada na fé. As primeiras notícias do culto dos ícones procedem de finais do séclo V.

15 São Martinho era filho de um tribuno romano e discípulo de Santo Hilário de Poitiers (+ 367); sendo catecúmeno repartiu sua capa, que logo se converteu em uma jóia do império sobre a qual se prestavam os juramentos e que se usava levar consigo nas batalhas. Foi o mais glorioso apóstolo da Gália, coroado com o êxito contra o arianismo e contra o resto do paganismo.

16 Também a este respeito São Gregório de Tours nos oferece ampla documentação; de modo incrível e refinado se tratava de iludir o direito de asilo. Um exemplo horrível: o duque Rauching jurou não separar a um jovem casal que se havia refugiado na igreja e logo mandou sepultar vivos aos dois (o marido pode ser salvo pelo pároco). O que caracteriza a época é a enorme repetição de casos similares.

17 Um bispo jurou sobre um relicário, do qual previamente havia retirado as relíquias, e por isso se acreditou autorizado a romper seu juramento.

18 Na Alemanha sul-ocidental se tem comprovado 844 construções de igrejas na primitiva Idade Média. O número total de igrejas na Alemanha em meados do século IX pode fixar-se com toda probabilidade em três mil e quinhentos.

19 Também nos fala disto São Gregório de Tours em inumeráveis capítulos de sua Historia Francorum.

20 Mas, segundo uma disposição de São Gregório Magno, um escravo, antes de ingressar no mosteiro, tinha que ser resgatado pelo mesmo mosteiro, e se logo o abandonasse, tinha que voltar à escravidão.

21 Além, de tudo esta notícia da Historia Francorum não é indiscutível desde o ponto de vista histórico.

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